segunda-feira, 6 de outubro de 2014

uma média

classe mérdia
tá sempre fazendo média
sai da média, volta pra média
dá meio volta só em torno de si mesma
tira a medida do próprio umbigo
é uma mérdia

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Não amei em papel

Nunca falei de amor
Não versei, não cantei
Não rabisquei juras eternas
Não desenhei no papel as palavras sussurradas

Amor só se for no olhar
No ato, atado
Sem a frouxidão dos versos
Nem cinema me convence mais

Meu amor não dá conta das linhas
Me escapa em prosa
Me abandona em poesia
Mas me encontra todo dia

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Mundo vasto mundo

Mundo vasto mundo 
Na ponta dos pés e com braços largos
Salivando
Eu te abocanho 
Mundo vasto mundo
Caiba nesse bolso vazio
Que guarda segredo
Mundo, eu te expando
Para caber meus quereres
Mundo, eu te encolho
Se preciso for
Para te engolir inteiro

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Gosto de adeus

Hoje o dia está se fazendo em adeuses. Adeus eu, adeus tu, adeus nós, adeus lugar. O fim do ano carrega a responsabilidade de dar conta de um ano inteirinho, das despedidas, das desculpas, das reconciliações, dos reencontros.
Esse fim de ano está com os ombros pesados, cheio de responsabilidades e obrigações a serem cumpridas antes da meia-noite do dia trinta e um.
Ao mesmo tempo ele é a nossa segunda chance, porque é nos quinze do segundo tempo que vamos acertar nossos ponteiros, tentar deixar nos eixos o que a falta de tempo não nos deixou fazer durante todo ano.
Não sei se só eu sinto essa melancolia transvestida de felicidade, de euforia que surge no fim do ano. Eu sinto essa melancolia impregnada nas propagandas de fim de ano, no Roberto Carlos cantando o jingle de natal da Globo, nos shoppings entupidos. A nossa sorte é que nascemos em um país tropical, aonde não tem neve para nos deprimir mais ainda, pelo contrário, temos o sol, e o prenúncio de uma temporada cheia de energia, cores e insolação.  

Hoje ó dia está se fazendo em adeuses. Adeus rua, adeus palmeiras, adeus açaí com pão de queijo. Até o bife de filé mignon do almoço tava com gosto de último. Quase falei com o rapaz  que frita os bifes “Olha, vê se capricha que hoje é a última vez que eu como aqui!”, como se ele fosse se compadecer da minha ausência pelo próximo ano. No restaurante comi o meu predileto, o bife com batata doce, combinação que eu mesma criei e me viciei. Em homenagem ao dia comi com muito gosto, gosto que não vou mais sentir daqui a pouco.

Hoje o dia está se fazendo em adeuses. Até o 435 chega a dar saudade, a correria do meio dia. Sou muito apegada às coisas, até do que eu não gosto eu me apego e sinto falta depois. Acho que tudo que faz parte do nosso dia a dia, do nosso cotidiano, mesmo que chato ou ruim, quando se acaba abre-se um vácuo, um espaço que precisa ser novamente preenchido. Eu sentia uma dor nas costas horrível há uns anos atrás, tomava remédios, fazia fisioterapia, entrei na yoga para melhorar, e quando finalmente me vi livre dela me bateu um vazio imenso, senti falta da rotina, senti falta do que é habitual. Senti falta do que reclamar.

Sinto falta de coisas comuns. Sinto falta do que me é comum. Sinto falta do que me faz sentir nem tão comum.




quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Até o fundo

Palavras que não consolam mais
E a escrita que não é mais salvação
O precipício é um alento
É tentação, é afago, é sossego
Dou um pulo
Salto
E me salvo

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Dizem que eu sou louco

Serei eu que tipo de louca?
Que tipo de mal insano eu devo carregar em mim?
Penso nos loucos da minha rua. A minha rua habita loucos aos montes.
Penso na Maluquinha do cuspe, que cospe feito atiradeira no rosto de quem passa despercebido, ela também grita, urina e defeca no chão da rua sem o menor pudor, afinal, é louca! E aos loucos é permitido quase todos os tipos de atos. Aos loucos é permitida uma espécie de liberdade única. Que nós, os sãos, não encontramos nunca.
Tem também a Doida do fogo, que cospe fogo pelas ventas, desce a rua com seu isqueiro e uma garrafinha de álcool, sempre pronta a nos surpreender com sua habilidade em pirotecnia.
Logo depois dela, vem descendo o Doido atormentado, não que todos eles não sejam atormentados, mas esse nos deixa claro todo dia seu transtorno. É culpa de um filho da puta que o levou mulher e filho e ainda de lambuja, todo o seu dinheiro. Essa versão é a que ele esbraveja aos quatro ventos, e faz promessa de morte ao invisível, sempre ameaçando o vento com uma garrafa ou pedaço de madeira.
Antes tarde do que nunca, vem o Louco da madrugada. Eu não sei por que, mas ele sempre vem depois da meia noite. Os outros loucos perambulam e fazem seu protesto em plena luz do dia mesmo. Já este prefere a noite e sua calmaria. Grita nomes em vão, xinga até sua última geração, mas não faz mal a ninguém.
Estes são loucos com razão, se é que há alguma razão na loucura...Acredito que haja. Não sei o que dizer da minha loucura. Como explicar uma loucura que não me deixa dormir às quatro horas da manhã? Que deixa acordada à contemplar o teto e buscar nele solução? Que faz tremer a mente e tudo o que sobre de razão nela?
Eu sei que me cansei dela, dessa minha loucura.. Não sei fazer um espetáculo do porte dos loucos da rua, logo, se não sei fazer loucura com tudo que ela tem direito, sou obrigada a me retirar da categoria.
Abro espaço aos loucos de verdade, aos criativos e inventivos, os capazes de viajarem para outros mundos e serem o que der para ser. A mim, cabe apenas uma insignificância nesse ramo. Não, não passei no teste. Não sou louca, só perdi o sono por algo que não valia muito a pena. 

                                         

                                               

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

O índio caído

Era a minha parte favorita da viagem a Campos. Eu viajo para Campos dos Goytacazes desde que me entendo por gente, freqüento tanto e faço tão pouca coisa por lá que nem posso mais considerar uma viagem de verdade. Mas após as quatro longas horas de viagem, pela BR-101, recheadas de sanduíches e biscoitos para distrair a barriga havia algo no fim da viagem que quando criança era, para mim, praticamente o pote de ouro no fim do arco-íris.
A cidade de Campos era terra dos índios Goitacás e como referência ao seu passado histórico fora erguida a estátua de um índio fazendo alusão aos verdadeiros representantes daquela terra. Como todo índio que se preze, o índio Campista vestia uma saia e era munido de um belo e poderoso arco e flecha. Eu não sei dizer, mas aquele indígena exercia um grande fascínio sobre mim, e lá na minha casa quando se anunciava a ida para Campos eu logo pensava “Eba! Vai ser dia de índio!”.
Mais importante que ver tia, avó, primos ou festa de São Salvador (a quem interessar possa este é o padroeiro da cidade do norte fluminense), o índio era o grande carro chefe da cidade na minha humilde opinião infantil. Ser recebida por ele de braços abertos, ou melhor, de arco e flecha na mão, era o máximo. Essa recepção despertava em mim a idéia de que uma aventura estava prestes a começar.
O tempo passou, os governantes mudaram, Garotinhos e Rosinhas se proliferaram, e a modernidade com seu ar de colonizador derrubou a estátua do índio. A cidade passou por um período de turbulência na política, mas sua economia se destacou pela exploração de petróleo na Bacia de Campos.
Mudou-se o contexto, mudou-se o foco. O que era para ser rural virou urbano. O que era para contar história contou futuro. O que era para ser valorizado foi tombado e no pior sentido da palavra.
Derrubou-se a estátua do índio e em seu lugar reina uma horripilante estrutura representando as máquinas que extraem petróleo na plataforma. É como se a revolução industrial estivesse devastado os nativos de Campos. Aí, você em diz “Mas é bem mais moderno”, “É sinal de novos tempos”, “Mostra o desenvolvimento da cidade”. E eu te digo ”É assim que se aniquila o passado”, como se faz o presente e se programa o futuro, sem olhar para o passado? Eu vejo um atropelamento da praticidade sobre tudo o que contou a história.
Ao observar as cidades notamos aqueles prédios velhos do início do século passado tentando sobreviver, quase que se afogando no meio de tanta obra, prédios de concreto e arranhas céus, que surgem no lugar do que é antigo. Toda história é varrida de nossas memórias e substituída por um belo prédio de concreto. As cidades contam sua história, a cada velha casa, e cada fachada moribunda é uma página do seu passado.
No nosso mundo hoje sei que não há tempo para ontem. Mas ontem nem faz tanto tempo assim, o ontem acabou a vinte e quatro horas atrás. A modernidade ou os chamados “novos tempos” já atropelaram tanto os resquícios de uma história que hoje a modernidade, com suas novidades e atualizações a cada segundo, também já é passado. Somos todos sucumbidos pelo tempo que corre demais.
O índio do Trevo em Campos não conseguiu se manter como dono da terra. Araribóia em Niterói que se cuide, e os indígenas da Praça Tiradentes podem estar com os dias contados. E a qualquer momento, quando estivermos muito absortos com nossos smart phone ou Iphones, sem atenção ao que ocorre no nosso redor, neste momento exato, seremos também sucumbidos pela velocidade e pelo fato de sermos tão descartáveis quanto qualquer estátua em uma cidade.

                 

                                    Aqui jaz um Goitacás